segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009


Ela tinha sonhos, como todo mundo. Acalentava um sonho de criança: ver a neve. Este era um sonho, no meio de tantos que lhe pairavam a cabeça antes de dormir. Já realizara alguns dos sonhos, mas ainda não conseguira ver a neve. Sabia que a imagem era infantil, que era baseada nos filmes da sessão da tarde e, às vezes se sentia meio tola, mas ver a neve era seu sonho secreto.
Era uma mulher que conhecia alguns países, conhecia o seu país e já tivera a oportunidade de ver a neve, mas seu sonho tinha detalhes específicos. Não bastava apenas ver a neve. Queria companhia para sentir o frio da neve, poder fazer bonecos de neve, comer marshmallow na janela, olhando a neve cair. E tinha que ser na Suíça. Nada seria mais romântico que ver a neve, na Suíça, ao lado de alguém que a amasse. Não deveria ser tão difícil encontrar alguém para amá-la. Era divertida, inteligente, simpática, batalhadora, inteligente, bonita, independente, tinha amigos, uma família. Mas tinha um defeito que a anulava. Era boa demais. Não sabia dizer não. Fazia tudo para agradar os outros e, muitas vezes, abria mão da sua felicidade. Assim, não se sentia completa. Sentia que dava o seu melhor para as pessoas e não recebia de volta o mesmo. Não que fizesse o bem o querendo de volta. Fazia porque acreditava no bem.
Com o tempo foi sentindo falta de algo que desconhecia. Como se houvesse um grito preso, que a impedisse de ser feliz.
Queria um amor, mas um amor de verdade, não os encontros arranjados a que tivera que se submeter inúmera vezes para agradar os amigos e parentes. Sempre alguém conhecia alguém de quem ela ia gostar, ou como diziam:um bom partido. Nenhum deles chegava perto do seu ideal.
Com o tempo, passou a inventar histórias para evitar os encontros. Num dia tinha compromisso com outro grupo de amigos, no outro os amigos do trabalho iam se reunir, em alguns fins de semana havia festas de família. Até que resolveu inventar que saía com alguém. Foi um alvoroço. Todos queriam conhecê-lo, saber quem era, o que fazia. E, para não decepcionar os outros, a história cresceu. De alguém que nem existia, passou a ter um namorado. Ela saía sozinha, escapava para o cinema, viajava nos fins de semana, comprava presentes pra si mesma. Até o momento em que acabar com a farsa ficou difícil e o que começou para lhe proteger, a fizera prisioneira. E fugiu!
Juntou suas economias, vendeu carro, apartamento, largou o emprego e foi pra Suíça. Lá, ela se reinventou. Criou um nome, arrumou emprego numa livraria, conheceu pessoas novas, passou a se amar, a acreditar mais em si mesma e chorou de emoção ao ver pela janela os flocos de neve que caíam, enquanto ela comia marshmallow com a melhor companhia que poderia exisitir. Ela mesma.

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